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sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Balanço de um Fracasso



Balanço de um Fracasso

Vilsom Jair Barbosa

Nesta sexta-feira, 03 de agosto do ano da Graça de 2012, o escrevinhador está tornando-se um homem verdadeiramente sex.

Sexagenário!

O que fazer é que não falta. Estou em plena campanha eleitoral, disputando voto a voto uma vaga na Câmara de Vereadores, num município onde há pouquíssimo tempo, um candidato teve que ceder a vaga, pelo critério da maior idade para desempate. Diferença de um, dois votos é coisa corriqueira. E, num cenário assim, parar tudo para reflexões, pode significar a perda da eleição.

Mas, assumo, consciente e refletidamente o risco, para fazer um balanço dos meus sessenta anos de vida.

Cheguei à conclusão que sou um baita fracassado.

E provo.

Comecei cometendo o erro de nascer numa família pobre. Não me permitiram escolher pais milionários, ricos, sequer remediados. Nunca passei fome, mas que vendi revistas em rodoviária, aos sete anos, isso vendi.

Também não tive o privilégio de ter um pai com estudo. O seu Hilário Barbosa aprendeu a ler na Bíblia. Mas, por algum mecanismo de compensação, o homem sabia capítulos e mais capítulos do Livro Sagrado, de cor e salteado ...

Minha mãe empacou lá pela quarta série; portanto, além de pobres, ambos sem preparo intelectual.

O cenário do fracasso estava preparado desde o início.

Para não decepcionar minhas origens caprichei nas escolhas rumo à mediocridade.

Pulando no tempo, para não ser, também, um fracasso como cronista, depois de estudar com muito sacrifício, concluí o curso de Direito e fui ser fotógrafo. Assim, como advogado, nunca consegui pôr nenhum marginal, ladrão, assassino, estuprador ou pedófilo de novo nas ruas. Como esta clientela é a que costuma pagar bem, na minha atuação judicial, pouco troco embolsei e continuei firme no rumo traçado de não ser um homem de sucesso.
Em quase tudo o que fiz, sempre deixei passar as oportunidades de acumular bens.

E o tempo passando, passando.

E quando vi, virei um velho de sessenta anos, como diria a música do Belchior, "latino-americano, sem dinheiro no bolso, sem parentes importantes e vindo do interior" .

O espelho do fracasso.

Ou não é fracassado um homem que aos sessenta, mal e mal tem onde morar, uns troquinhos ganhos suadamente para a comida, um carrinho básico, um aviãozinho teco-teco e quase nada mais?

Onde já se viu um velho correr quarenta e dois quilômetros no ano da entrada na terceira idade? Só um fracassado pode ter tempo para treinar, correr, suar tanto.

Não é um fracasso ter uma filha linda, chamada Juliana, que, mesmo havendo completado um curso superior, está comendo o pão que o diabo amassou na luta pela sobrevivência, mas não vendeu o bem mais precioso, a dignidade e a perseverança na luta pelo rumo traçado para sua vida?

É um baita fracasso, com sessenta invernos no lombo, um homem que em vez de trabalhar, brinca de fotógrafo e piloto, porque, quando a gente faz o de que gosta, não está trabalhando.

Com sessenta anos, pela primeira vez disputar uma eleição nunca foi ou será marca de êxito na vida.

Mas esta disputa está mostrando o quanto os filhos da Dona "Lurde"e do seu Hilário - o digníssimo aqui, o Paulo Rui e a Maria Cândida são unidos, atendendo ao que pediu a matriarca Ana Cândida: "Nunca se deixem dividir. Esta chácara tem que ficar nas mãos da família enquanto um membro dela ainda for vivo."

E atendendo a este chamado é que vim completar minha derrocada - morando na campanha, depois de cinquenta anos correndo mundo e morando na capital.

Vim, deliberadamente buscar o retrocesso. Vim, estudadamente, buscar a falta de ambição. Vim, por livre e espontânea vontade perseguir a falta de perspectivas de ganhos materiais.

Em minha estratégia de busca ao marasmo, à estagnação, acho que sou um sucesso ...

Um velhote de sessenta anos receber a visita de sobrinho que andava lá do outro lado do mundo e que, apesar da longa viagem de retorno da Ásia, pega um avião e vem dar um abraço no ermitão, só pode ser um desses que a vida relegou.

Receber outros sobrinhos que mal acabaram de retornar dos Estados Unidos, de longas viagens pelo Brasil, também deve ser sinal de que o dito, de tão mal na foto, merece uma última demonstração de apreço.

Ter uma esposa que renuncia a muitas coisas pessoais, para ajudar o marido prova mais uma vez o quanto o homenzinho deixou de ir para a frente, pois o normal o homem ajudar e proteger a mulher e não o contrário.

Retornar para viver no lugar onde se passou a infância e boa parte da adolescência, é outra prova cabal de que a vida foi desperdiçada.

Onde já se viu, levantar de manhã, olhar para a frente e lembrar de que naquela coxilha o cavalo "Gato" desceu em disparada, com um toco de gente, de quatro anos, agarrado nas crinas, perdendo pelego, enxergão, mas não desgrudando do flete, até que ele, o cavalo, resolveu parar no banhado, lá adiante. Banhado onde alguns anos depois, um bando de piás, com os respectivos companheiros cuscos caçavam preás a coice, bodocaço, etc.?

Qual é a graça de olhar para um pé de figueira à frente de uma tapera e lembrar dum velhinho relativamente franzino, careca, meio maniático, mas que só pelo olhar conseguia impor respeito e consideração? Um velhinho meio caduco na cabeça de alguns, mas terno e emotivo o suficiente para fazer uma "patente" especial para o tamanho do piazinho de três anos. Que aturava o gurizinho fazendo mil perguntas, no escritório da Fazenda Bom Retiro, enquanto o adulto furungava no rádio Telefunken a válvula, perseguindo as ondas, para ouvir as notícias até que um dia veia a fatídica nova do suicídio de Getúlio Vargas, o ídolo político da fazenda e redondezas.

Tem que ser fracassado para viver num lugar de horizontes largos, de gado berrando, de bugios com seu ronco na Restinga, de tarrã gritando num final de tarde, chamando a companheira.

Não eu não fui à Europa. Tampouco à América do Norte.

Somente andei pelo Brasil, pelo Rio Grande.

Só um fracassado pode ter andado por sua terra natal a pé, vendendo livros, indo duma cidade à outra, aos treze anos.

Os privilégios que a vida me outorgou, permitiram conhecer os mesmos lugares, depois, dirigindo e pilotando avião.

Este velho Rio Grande eu tenho o privilégio de conhecer quase  como a palma da mão. Dá para saber, em alguns lugares onde está o carreiro das formigas.

E, se existe algum lugar para ser feliz, é este, que não troco por nenhuma Paris, Nova Iorque ou algo parecido.

Sessenta anos!

Pobre de pilas! Nem vereador consegui ser até agora. Não sou famoso. A minha mulher não é modelo, atriz rica ou socialite.

Que baita azarão de cancha reta é que fui sair.

Ah, mas agora me lembrei que daqui a pouco vou dar uma corridinha básica, para manter a forma, que a maratona de 2013, com seu desafio de 42 km me espera.

Ia esquecendo que meus irmãos, antes de viajarem, passaram o tempo todo me dando dicas sobre estratégias de campanha e, colocando a mão no bolso, para ajudar.

Também ia esquecendo que as mulheres que amei antes da que amo agora, seguiram rumos diferentes, mas são minhas amigas. Sinal de que não devo ser assim, uma pessoa de todo má.

Sessenta anos e a conta bancária meio magra.

Sessenta anos de modestas roupas, carros e aviões.

É um fracasso, mesmo. Onde já se viu passar no vestibular para Direito numa Universidade Federal e depois deixar o diploma pendurado só porque o desafio tão ou mais difícil, à época, de conseguir o brevê de Piloto Privado me atraiu?

A gente vê cada uma ...

Bem, passaria uma semana comprovando o quanto fracassei.

Mas, no frigir dos ovos, cheguei a conclusão de que quando for desta para outra, o Céu vai ter que ser muito, mas muito bom, porque, se não for, peço demissão do cargo de anjo, compro uma passagem de volta para a Chácara e quero ver me atraírem lá para cima de novo ...

Os meus sessenta foram comemorados com uns dias de antecedência e, por ironia da vida, exatamente no meu aniversário estou sozinho na Chácara, fazendo um balanço do quanto fracassei.

Mas me perguntem quem eu gostaria de ser na próxima encarnação:

A resposta pronta, curta, enfática, sempre será:
- Vilsom Jair Barbosa!

"Ah, e ainda por cima bom escrevinhador ..."

Por isso, altruisticamente, deixo o sucesso a quem interessar possa.

Palma - São Vicente do Sul, 03 de agosto de 2012.

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